Amor Verdadeiro
Tua frieza aumenta o meu desejo: fecho os meus olhos para te esquecer, mas quanto mais procuro não te ver, quanto mais fecho os olhos mais te vejo.
Humildemente atrás de ti rastejo, humildemente, sem te convencer, enquanto sinto para mim crescer dos teus desdéns o frígido cortejo.
Sei que jamais hei de possuir-te, sei que outro feliz, ditoso como um rei enlaçará teu virgem corpo em flor.
Meu coração no entanto não se cansa: amam metade os que amam com espr'ança, amar sem espr'ança é o verdadeiro amor.
Eugénio de Castro(1869-1944), in 'Antologia Poética'
La Promenade(1870)
Pierre Auguste Renoir (1841-1919)
Análise do poema:
“Amor Verdadeiro”- Eugênio de Castro
Eugênio de Castro apresenta no poema a forma clássica do soneto petrarquiano, com dois quartetos e dois tercetos. O autor enquadra-se na Escola Simbolista pelo uso de rimas novas e raras, novas métricas, sinestesias, aliterações e vocabulário mais rico e musical.
No poema, o eu lírico descreve o amor impossível por uma musa que o desdenha. A rejeição faz com que seu desejo cresça. Sua conclusão é a de que apenas o amor sem esperança pode ser verdadeiro.
Este soneto difere-se da estética Parnasiana e aproxima-se do Romantismo por sua temática subjetiva, com enfoque no amor impossível. Há uma sugestão de sensualidade: “teu virgem corpo em flor”. No entanto, o eu lírico não concretiza seu desejo, acarretando na transcendência do seu amor. A não concretude desse amor é o que o move.
Sua musa não é descrita em detalhes e não há um esclarecimento do motivo de seu desdém. Tais indefinições são características do poema simbolista, em que a descrição minuciosa dá lugar à sugestão.
O vocabulário do soneto evoca sensações táteis: frieza, frígido; e sensações visuais: olhos, ver, vejo. Há também a ocorrência de aliterações com os fonemas /m, /n/ e /j/ que evocam leveza e continuidade, possivelmente em referência à postura resignada do eu lírico que abraça a natureza de seu desejo