Africa
Ao longo do século XX, o Brasil e a África do Sul implementaram políticas completamente diferentes, senão opostas, na definição e no tratamento das relações raciais1. Enquanto no Brasil evitou-se o estabelecimento de qualquer tipo de classificação racial formal desde o final da escravidão em 1888, na África do Sul um regime de segregação estruturado foi mantido até 1990.
O conceito de raça tem significados muito diferentes em cada um desses contextos: no Brasil, as fronteiras raciais são imprecisas, a segregação racial residencial é baixa e o casamento inter-racial é comum; na África do Sul, as fronteiras raciais são mais rígidas, a segregação racial residencial é alta e o casamento inter-racial é muito raro. O paradoxo empírico que este artigo tenta elucidar é como e por que países com históricos tão díspares de relações raciais adotaram, no início do século XXI, políticas semelhantes para lidar com as desigualdades étnicas e raciais: ações afirmativas.
Como viajam as políticas?
Durante a década de 1990, as ciências sociais começaram a discutir como a cultura influencia o planejamento e a implementação de políticas públicas (cf. DiMaggio e Powell, 1991; Jacobsen, 1995). A maioria desses estudos estava reagindo às teorias da escolha racional, que consideravam a política o produto direto de interesses. A percepção sociológica de que a cultura
1.Apesar de ser uma ficção biológica, utilizo o conceito de raça como um fato social no sentido clássico durkheimiano: “Toda maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, toda maneira de fazer que é geral na extensão de uma sociedade dada e, ao mesmo tempo, possui uma existência própria, independente de suas manifestações individuais“ (Durkheim,
1988).
Ações afirmativas no Brasil e na África do Sul, pp. 131-165
2.“Não as idéias, mas os interesses materiais e ideais governam