1409 FiloTecno 2015 1 16
3086 palavras
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A dupla moral brasileira1A existência de normas sociais implica a possibilidade de infringi-las.
Ao multiplicar as tentações, as sociedades contemporâneas são particularmente propícias à transgressão.
A hibridez no caso brasileiro
Em julho de 1997, na abertura do programa de televisão Você Decide, da TV Globo, que introduz episódios polêmicos e solicita aos telespectadores que telefonem, posicionando-se a respeito do final preferido, o apresentador perguntou: “Você abriria mão de seus princípios em nome de uma vida melhor?” Para espanto do diretor, boa parte dos telespectadores que se pronunciaram não teve dúvidas em responder “sim”. O episódio “Cobiça” colocava uma secretária diante de uma oferta claramente ilícita: assumir o papel de “laranja” em uma “conta fantasma”. A proposta fora feita por seu chefe, um empresário, dono de uma corretora de valores e envolvido em fraude financeira. Honesta até então, a secretária sofreu pressões tanto de seu chefe como de seu marido, que se dizia ameaçado de morte por causa de dívidas de jogo.
Os espectadores optaram entre três finais: 24,3% disseram que a secretária deveria denunciar o chefe; 27,2% acharam que deveria pedir demissão e silenciar sobre o esquema; e 48,5% consideraram que a secretária deveria aproveitar a chance de melhorar de vida e entrar no esquema.2 Foi então passado o terceiro final.
Se somarmos os que mantêm uma irrepreensível posição de integridade (a denúncia) aos que preferem afastar-se sem comprometer-se (a demissão e o silêncio), teremos 51,5%, o que revela a ambiguidade que marca com clareza o imaginário brasileiro, uma vez que o restante dos respondentes (quase metade da amostra) simplesmente aderiu ao oportunismo.
A abertura comercial acompanhou o abandono do modelo protecionista de desenvolvimento e coroou a falência financeira do Estado. Adotou-se, por imposição estrutural, um modelo de integração competitiva no mercado mundial, o que representa um dos mais importantes desafios