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UNIESP – União das Instituições Educacionais do Estado de São PauloLITERATURA PORTUGUESA II
ANTERO DE QUENTAL (1842-1891)
Sonetos
Hino à Razão
Razão, irmã do Amor e da Justiça,
Mais uma vez escuta a minha prece,
É a voz dum coração que te apetece,
Duma alma livre, só a ti submissa. Por ti é que a poeira movediça
De astros e sóis e mundos permanece;
E é por ti que a virtude prevalece,
E a flor do heroísmo medra e viça. Por ti, na arena trágica, as nações
Buscam a liberdade, entre clarões,
E os que olham o futuro e cismam, mudos, Por ti, podem sofrer e não se abatem,
Mãe de filhos robustos, que combatem
Tendo o teu nome escrito em seus escudos
Ideal
Aquela que eu adoro não é feita
De lírios nem de rosas purpurinas,
Não tem as formas lânguidas, divinas, Da antiga Vênus de cintura estreita... Não é a Circe, cuja mão suspeita
Compõe filtros mortais entre ruínas,
Nem a Amazonas, que se agarra às crinas
Dum corcel e combate satisfeita... A mim mesmo pergunto, e não atino
Com o nome que dê a essa visão,
Que ora amostra ora esconde o meu destino... É como uma miragem que entrevejo,
Ideal, que nasceu na solidão,
Nuvem, sonho impalpável do Desejo...
Tese e Antítese
I
Já não sei o que vale a nova ideia,
Quando a vejo nas ruas desgrenhada,
Torva no aspecto, á luz da barricada,
Como bacante após lúbrica ceia...
Sanguinolento o olhar se lhe incendeia;
Respira fumo e fogo embriagada:
A deusa de alma vasta e sossegada
Ei-la presa das fúrias de Medeia!
Um século irritado e truculento
Chama á epilepsia pensamento,
Verbo ao estampido de pelouro e obuz...
Mas a ideia é num mundo inalterável,
Num cristalino céu, que vive estável...
Tu, pensamento, não és fogo, és luz!
II
Num céu intemerato e cristalino
Pode habitar talvez um Deus distante,
Vendo passar em sonho cambiante
O Ser, como espetáculo divino.
Mas o homem, na terra onde o destino
O lançou, vive e agita-se incessante:
Enche