O ANTROPÓFAGO ELISABETANO
A partir do século XVIII, com o advento do Romantismo, Shakespeare foi tomado como um “gênio criativo”. Os poetas românticos, que se interessavam pelo rompimento com o antecedente e criaram a estética do “gênio” como aquele que cria a partir do nada, atribuíram a Shakespeare esse posto deixando de considerar uma série de fatores mais a frente mencionados. Para entender a grandiosidade do dramaturgo inglês, no entanto, é preciso ir além desse conceito e considerar outras formas criativas anteriores ou posteriores a ele como, por exemplo, a antropofagia de Oswald Andrade.
Considerando as 36 peças publicadas em 1623 (first Folio), não mais que 4 possuem argumentos originais. As demais se baseiam em histórias e ideias de outros. Tomando como exemplo Hamlet, a narrativa do príncipe atormentado pelo fantasma do pai que diz ter sido assassinado pelo irmão, agora rei em lugar do próprio Hamlet, tem origem na história de Amleth, originária do século 12 e publicada em 1514 no Historiae Danicae. Ainda antes de Shakespeare, foi publicada na França uma versão da mesma história por François de Belleforest em 1570 na qual Gertrude tomava conhecimento dos planos do filho e o incentivava a se vingar. Além dessas, ainda há a possibilidade de uma terceira versão anterior a de 1623, supostamente escrita por Thomas Kyd, ainda no período elisabetano intitulada Ur-Hamlet sobre a qual pouco se sabe.
O Shakespeare elisabetano claramente se apropria de outras peças e ideias e as transforma suas obras. No entanto, não por isso deve ser visto como menos apreço – realiza tal apropriação de forma magistral e cria obras ricas e cheias de sentidos próprios. Tomando como exemplo uma apropriação de um fato histórico, como se dá em Júlio César, podemos perceber como isso toma forma. Por se tratar de um drama histórico, poderia se considerar a existência de uma dificuldade em criar um clímax para a peça, dado que a História já contou a história que o teatro se