A última entrevista a José Saramago
Em "Caim", a nova obra do Prémio Nobel da Literatura lançada, ontem, domingo, em Penafiel, o autor visita episódios do livro sagrado e volta a contar "histórias mal contadas"
Publicado em 2010-06-18
FERNANDO BASTO
Entrevista publicada em 2009-10-19 Há que ter cuidado com o que se lê. E com a Bíblia mais cuidado ainda se deve ter. O aviso foi lançado, ontem, domingo, por José Saramago, numa breve sugestão ao conteúdo de "Caim", a sua obra mais recente.
O Prémio Nobel da Literatura afirma desconhecer por que motivo alguns episódios ganharam tanta relevância na civilização judaico-cristã. Em entrevista ao JN, não deixa de comentar outros episódios, mais políticos. E considera que nenhumas melhores mãos poderiam ter recebido, este ano, o Nobel da Paz do que as de Barack Obama.
Hoje [ontem] é o dia da apresentação mundial do seu novo romance, "Caim", em Penafiel. Depois de uma história sobre uma viagem de um elefante, digamos que regressa, agora, a temas mais profundos.
A história de um elefante que vai de Lisboa para a Áustria é um episódio real, que efectivamente sucedeu quando o rei D. João III resolveu oferecer um ao imperador da Áustria. Com isso, pode-se contar uma história, que está contada. Neste novo livro é diferente. Agora é pôr em questão a Bíblia sagrada, em que habitualmente não se toca. É sagrada e não se toca. Tem de haver uma leitura humana de tudo aquilo que existe, do que se passa, do que se escreve. É claro que pode haver uma leitura interpretativa. Agora, pôr uma verdade no lugar de outra, ou pôr aquilo que não é verdade no lugar da verdade do texto, da literalidade do texto, não me parece muito honesto.
E porquê "Caim"?
As coisas acontecem quando têm de acontecer. É um assunto que me interessa há muitíssimos anos. E - não sei como nem porquê - foi nesta altura que se me apresentou com força suficiente para me levar e sentar-me e a escrever.
Há temas da Bíblia que suscitam a sua curiosidade