a rainha do micro ondas
Sérgio convidou Cláudia para jantar e disse que ele mesmo faria a comida.
― O meu nhoque é famoso.
― Quero só ver, riu a Cláudia.
― Quarta-feira?
― Quarta-feira.
Na quarta-feira, Sérgio abriu a porta para Cláudia de avental. Explicou que não, não acabara de decapitar uma galinha. O sangue no avental não era sangue, era o molho do nhoque. Pequeno acidente. Nada grave. Estava nervoso.
Instalou Cláudia na sala, perguntou se ela já queria começar no vinho ou se preferia um aperitivo, ela perguntou se tinha Campari, não tinha, ela disse que vinho estava ótimo, ele serviu o vinho, ela perguntou se podia ajudar em alguma coisa, ele disse que não e voltou para a cozinha. Quando sentaram-se para jantar, ela perguntou:
― Por que nervoso?
― Você aqui, no meu apartamento? Comendo a minha comida?
Espera aí um pouquinho.
Cláudia sorriu. Pensou em dizer “Eu é que devia estar nervosa, sozinha, aqui no seu apartamento”, mas não disse. Pensou em dizer “Eu nunca esperava ser convidada”, mas não disse. Pensou em dizer “Eu não podia sonhar que você estava a fim de mim”, mas não disse.
Deixou o sorriso dizer tudo.
― São de farinha.
― Hein?
― Os nhoques. Faço com farinha, acho que ficam mais leves. O engraçado é que nhoque de farinha é considerado mais fino, mas o nhoque de batata é mais caro. Como você está cansada de saber.
― Sérgio...
― Sim?
― Posso te fazer uma pergunta?
― Já sei o que você vai perguntar. O molho. Acertei? Esse gosto diferente do molho. É o meu segredo. Você não adivinha o que tem no meu molho. Ninguém adivinha.
― Não, Sérgio. Eu ia perguntar...
― Pergunte.
― Por que a gente não esquece os nhoques e...
Ela parou de falar quando viu a expressão no rosto dele. Surpresa e dor.
Como se alguém tivesse lhe dado a notícia de uma morte na família. Uma tia favorita, atropelada.
― Você não gostou.
― O quê?
― Do nhoque.
― Não, adorei. Adorei!
― Você não gostou do meu nhoque.