Viajar
Um dia, mais tarde, posso tirar umas férias, por agora quero viajar.
O Ser-Humano deve a si mesmo o acto de desbravar o seu universo físico e intelectual.
Presentearam-no com a Vida. Enfiaram-no num corpo, equiparam-no com uma consciência e puseram-no neste planeta- “Vá, agora entretém-te por aí”. Não acredito que o que arquitectavam com esta experiência seja a tradução desta vida de cão rotineiro que todo o rebanho segue. O humano não é bom guardador de presentes, brica com eles mas depressa se farta e assim nunca será conhecedor de todas as faculdades do seu brinquedo. Pior ainda, assim que nasce, a comunidade em seu redor logo se une e em jeito de tirania apressa-se para que lhe sejam ensinadas, educadas, instruídas, doutrinadas, catequizadas e ensaiadas as duas ou três maneiras aprovadas e ao longo de milhares de anos aprimoradas ao ponto de perfeição sentenciosa para que ele possa, confiantemente e com destreza, desaproveitar a sua Vida.
Não desperdiçarei este presente, brincarei com este brinquedo, viverei esta vida.
Estou amarrado, com um cordel de aço, á rotina. Rugiram-me indicações para não me desamarrar até ao dia em que morrer. Segundo tenho ouvido, desviar-me do caminho traçado, assinalado com mestria de mestre, é atalho certo para a vila da desgraça. Mas também me têm chegado ao ouvido histórias de alguns desajeitados que empreenderam desviar-se do trilho trilhado e ainda assim foram contentes, mais contentes ainda do que um advogado licenciado e doutorado na arte de viver.
Concluo, assim, que cabe a mim, e não á comunidade, encontrar o que fazer com o meu presente a fim de não me restar a mínima suspeita de que um dia o possa ter desperdiçado.
Vou, pois então, ocupar-me com a mais prazerosa de todas as empreitadas. A de viajar o meu mundo,