Unb - geografia
Clarice Lispector
HORA DA ESTRELA
A CULPA É MINHA OU A HORA DA ESTRELA OU ELA QUE SE ARRANJE OU O DIREITO AO GRITO QUANTO AO FUTURO OU LAMENTO DE UM BLUE OU ELA NÃO SABE GRITAR OU ASSOVIO AO VENTO ESCURO OU EU NÃO POSSO FAZER NADA OU REGISTRO DOS FATOS ANTECEDENTES OU HISTÓRIA LACRIMOGÊNICA DE CORDEL OU SAÍDA DISCRETA PELA PORTA DOS FUNDOS
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APRESENTAÇÃO
Escrever estrelas (ora, direis)
Clarice Lispector deixou vários depoimentos sobre a sua produção literária. Em alguns, parecia se defender do estranhamento que causava em leitores e críticos. Ela tinha consciência de sua diferença. Desde pequena, ao ver recusadas as histórias que mandava para um jornal de Recife, pressentia que era porque nenhuma “contava os fatos necessários a uma história”, nenhuma relatava um acontecimento. Sabia também, já adulta, que poderia tornar mais “atraente” o seu texto se usasse, “por exemplo, algumas das coisas que emolduram uma vida ou uma coisa ou romance ou um personagem”. Entretanto, mesmo arriscando-se ao rótulo de escritora difícil, mesmo admitindo ter um público mais reduzido, ela não conseguiria abrir mão de seu traçado: “Tem gente que cose para fora, eu coso para dentro”. Ela se afastou dos “escritores que por opção e engajamento defendem valores morais, políticos e sociais, outros cuja literatura é dirigida ou planificada a fim de exaltar valores, geralmente impostos por poderes políticos, religiosos etc., muitas vezes alheios ao escritor”, em nome de uma outra forma de questionar a realidade e nela intervir, através da literatura. Talvez sem o saber, Clarice estava optando por um tipo de escrita característica do escritor moderno, para quem, no dizer do crítico francês Roland Barthes, escrever é “fazer-se o centro do processo de palavra, é efetuar a escritura afetando— se a si próprio, é fazer coincidir a ação e a afeição (...)”. Por esta via, formula-se uma outra