Sonhos
Volume 1 (p. 141-43)
III – O sonho é a realização de um desejo
Quando, após passarmos por um estreito desfiladeiro, de repente emergimos num trecho de terreno elevado, onde o caminho se divide e as mais belas paisagens se desdobram por todos os lados, podemos parar por um momento e considerar em que direção deveremos começar a orientar nossos passos. É esse o nosso caso, agora que ultrapassamos a primeira interpretação de um sonho. Encontramo-nos em plena luz de uma súbita descoberta. Não se devem assemelhar os sonhos aos sons desregulados que saem de um instrumento musical atingido pelo golpe de alguma força externa, e não tocado pela mão de um instrumentista (cf. págs. 98-9); eles não são destituídos de sentido, não são absurdos; não implicam que uma parcela da nossa reserva de representações esteja adormecida enquanto outra começa a despertar. Pelo contrário, são fenômenos psíquicos de inteira validade, realizações de desejos; podem ser inseridos na cadeia dos atos mentais inteligíveis de vigília; são produzidos por uma atividade mental altamente complexa. Contudo, mal começamos a nos alegrar com essa descoberta, e já somos assaltados por uma torrente de questões. Se, como nos diz a interpretação dos sonhos, um sonho representa um desejo realizado, qual a origem da notável e enigmática forma em que se expressa a realização de um desejo? Por que alteração passaram os pensamentos oníricos antes de se transformar no sonho manifesto que recordamos ao despertar? Como se dá essa alteração? Qual a fonte do material que se modificou, transformando-se em sonho? Qual a fonte das numerosas peculiaridades que se devem observar nos pensamentos oníricos, tais como, por exemplo, o fato de poderem ser mutuamente contraditórios? (Cf. a analogia da chaleira emprestada, na pág. 139.) Pode um sonho dizer-nos