religiao e religiosidade
TEXTO 01 – PERSPECTIVAS
“Aqui estão os sacerdotes; e muito embora sejam meus inimigos... meu sangue está ligado ao deles" (F. Nietzsche, Assim falava Zaratustra).
Houve tempo em que os descrentes, sem amor a Deus e sem religião, eram raros. Tão raros que os mesmos se espantavam com a sua descrença e a escondiam, como se ela fosse uma peste contagiosa. E de fato o era. Tanto assim que não foram poucos os que foram queimados na fogueira, para que sua desgraça não contaminasse os inocentes. Todos eram educados para ver e ouvir as coisas do mundo religioso, e a conversa cotidianamente, este ténue fio que sustenta visões de mundo, confirmava, - por meio de relatos de milagres, aparições, visões, experiências místicas, divinas e demoníacas - que este é um universo encantado e maravilhoso no qual, por detrás e através de cada coisa e cada evento, se esconde e se revela um poder espiritual. O canto gregoriano, a música de Bach, as telas de Hieronymus Bosch e Pieter Bruegel, a catedral gótica, a Divina Comédia, todas estas obras são expressões de um mundo que vivia a vida temporal sob a luz e as trevas da eternidade. O universo físico se estruturava em torno do drama da alma humana. E talvez seja esta a marca de todas as religiões, por mais longínquas que estejam umas das outras: o esforço para pensar a realidade toda a partir da exigência de que a vida faça sentido.
Mas alguma coisa ocorreu. Quebrou-se o encanto. O céu, morada de Deus e seus santos, ficou de repente vazio. Virgens não mais apareceram em grutas. Milagres se tornaram cada vez mais raros, e passaram a ocorrer sempre em lugares distantes com pessoas desconhecidas. A ciência e a tecnologia avançaram triunfalmente, construindo um mundo em que Deus não era necessário como hipótese de trabalho. Na verdade, uma das marcas do saber científico é o seu rigoroso ateísmo metodológico: