Portugues
DISCIPLINA: COMUNICAÇÃO ORAL E ESCRITA PROFA. ANA CRISTINA DOS SANTOS
ALUNO: _________________________________________Turma: _____________
TEXTO:
Os usos da fatalidade
A gente fala na emergência social brasileira, mas é uma imprecisão semântica. “Emergência” dá a idéia de coisa inesperada, de anormalidade súbita. E não se chega a uma situação como a da Febem de São Paulo de repente. Ela é construída aos poucos – é uma obra, literalmente, de gerações. O embrutecimento a este ponto de uma sociedade não acontece, assim, por uma mudança dos astros ou outro acidente alheio à nossa vontade ou longe do nosso controle. É um trabalho humano, consciente, o resultado de anos e anos de decisões adiadas, de coisas não feitas e desconversa. Qualquer estudo sobre a responsabilidade do patriciado brasileiro no horror que o cerca acaba sendo um estudo sobre os usos da fatalidade. A fatalidade é o álibi, a fatalidade é a desculpa, a fatalidade, no fim, é a explicação de tudo – não só das misérias reincidentes que resistem a todas as nossas boas intenções, mas dos arranjos políticos, da subserviência econômica, até do caráter nacional, ou de tudo entendido e subentendido na frase “o Brasil é assim mesmo”. O fatalismo dominante cria a fatalidade, este é o terrível círculo viciado em que vivemos. Só um fatalismo congênito, ou uma cultura fatalista, justifica o inferno carcerário como o que persiste no Brasil, uma das nossas tantas “emergências” eternamente sem solução. Só uma visão fundamentalmente pessimista da condição humana explica que a oitava economia do mundo, o país que festeja a sua própria excepcionalidade e criatividade em tantas outras áreas, descuide assim da sua saúde pública e do seu sistema penal, justamente as áreas em que a condição humana sofre a sua martirização na carne, no contato direto com o poder impotente de regenerar do Estado. Nos postos de saúde, nas cadeias e nas