poemas
Autor: Carlos Drummond de Andrade
Infância
Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre mangueiras lia a história de Robinson Crusoé, comprida história que não acaba mais.
No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeu a ninar nos longes da senzala - e nunca se esqueceu chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha café gostoso café bom.
Minha mãe ficava sentada cosendo olhando para mim:
- Psiu... Não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito.
E dava um suspiro... que fundo!
Lá longe meu pai campeava no mato sem fim da fazenda.
E eu não sabia que minha história era mais bonita que a de Robinson Crusoé.
Lembrança do mundo antigo
Clara passeava no jardim com as crianças.
O céu era verde sobre o gramado, a água era dourada sob as pontes, outros elementos eram azuis, róseos, alaranjados, o guarda-civil sorria, passavam bicicletas, a menina pisou a relva para pegar um pássaro, o mundo inteiro, a Alemanha, a China, tudo era tranqüilo em redor de Clara.
As crianças olhavam para o céu: não era proibido.
A boca, o nariz, os olhos estavam abertos. Não havia perigo.
Os perigos que Clara temia eram a gripe, o calor, os insetos.
Clara tinha medo de perder o bonde das 11 horas, esperava cartas que custavam a chegar, nem sempre podia usar vestido novo. Mas passeava no jardim, pela manhã!!!
Havia jardins, havia manhãs naquele tempo!!!
Para sempre
Por que Deus permite que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite, é tempo sem hora, luz que não apaga quando sopra o vento e chuva desaba, veludo escondido na pele enrugada, água pura, ar puro, puro pensamento.
Morrer acontece com o que é breve e passa sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça, é eternidade.
Por que Deus se lembra
— mistério profundo — de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,