Peça ajuda
(Castro Alves)
ADEUS! P'ra sempre adeus! A voz dos ventos
Chama por mim batendo contra as fragas.
Eu vou partir... em breve o oceano
Vai lançar entre nós milhões de vagas ...
Recomeço de novo o meu caminho
Do lar deserto vou seguindo o trilho...
Já que nada me resta sobre a terra
Dar-lhe-ei meu cadáver... sou bom filho!...
Eu vim cantando a mocidade e os sonhos,
Eu vim sonhando a felicidade e a glória!
Ai! primavera que fugiu p'ra sempre,
Amor — escárnio!... lutulenta história!
Bem vês! Eu volto. Como vou tão rico...
Que risos n’alma! que lauréis na frente...
Tenho por c'roa a palidez da morte,
Fez-se um cadáver — o poeta ardente!
Adeus! P'ra sempre adeus! Quando alta noite,
Encostado à amurada do navio...
As vagas tristes... que nos viram juntos
Perguntarem por ti num beijo frio,
Eu lhes hei de contar a minha história.
Talvez me entenda este sofrer do inferno
O oceano! O oceano imenso e triste,
O gigante da dor! o Jó eterno!
Fazia um ano. Era o dia
Do fatal aniversário...
Ergui-me da cova escura,
Sacudi o meu sudário...
Em meio aos risos e à festa
E às gargalhadas da orquesta,
Que eu tinha esquecido, enfim,
Tomei lugar!... Solitário
Quis rever o meu Calvárío
Deserto, tredo, sem fim!...
Sabes o que é sepultar-se
Um ano inteiro na dor...
Esquecido, abandonado,
Sem crença, ambição e amor...
Ver cair dia... após dia,
Sem um riso d'alegria...
Sem nada... nada... Jesus!
Ver cair noite após noite,
Sem ninguém que nos acoite...
Ninguém, que nos tome a Cruz?!
Ai! não sabes! nunca o saibas!...
Pois bem; imagina-o só...
E então talvez compreendas
A lenda escura de Jó.