Matéria escura
Alaor Chaves Departamento de Física – UFMG alaor@fisica.ufmg.br
Segundo Flannery O´Connor, toda história tem um começo, um meio e um fim, embora não necessariamente nesta ordem. Já Jorge Luis Borges apontou que a História gosta das simetrias, das repetições com pequenas variações. A combinação desses dois caprichos gera histórias que se emaranham em uma teia confusa, cuja narração nem sabemos como começar. É o caso da descoberta da matéria escura, que descrevermos neste artigo, e que rendeu a Vera Rubin o Prêmio Gruber de Cosmologia (US$500 mil) e várias medalhas prestigiosas. Arbitrariamente, começaremos pelo final, que para muitos foi o começo. Ou melhor, começaremos pela culminância, um acúmulo de medições astronômicas que, após as usuais polêmicas e remedições, levou os astrônomos a concluir que nas galáxias há muito mais matéria do que nossos telescópios são capazes de mostrar. Essa matéria extra não irradia luz, portanto não tem cargas elétricas, pelo menos na forma livre. É a chamada matéria escura. O personagem central dessa culminância foi Vera Cooper Rubin (Figura 1), a mãe de quatro filhos que achava muito mais interessante acompanhar o desenvolvimento de uma criança do que investigar os mistérios do Universo. Mas fez ambas as coisas muito bem. Demonstrou a existência da matéria escura e seus quatro filhos obtiveram o grau PhD.
Figura 1 – Vera Rubin (1928 – ) Desde menina, Rubin formulou para si a questão: a Terra gira, os planetas giram, as galáxias giram. Quem sabe o Universo inteiro também não gira? Aos 22 anos, gerou uma reação simpática, mas também muito cética, ao comparecer a um encontro de astronomia com uma criança de um mês para apresentar uma análise de dados sobre o movimento de 108 galáxias que haviam sido obtidos por outros astrônomos. Descontado o movimento de recessão devido à expansão do Universo, essas galáxias pareciam apresentar um movimento orbital em torno de um centro comum. A idéia de Rubin não era tão