Lembrar, esquecer, censurar
RUI TAVARES
La mémoire est nécessaire pour toutes les opérations de la raison. Pascal, Pensées, 651-369 (1) Había aprendido sin esfuerzo el inglés, el francés, el portugués, el latín. Sospecho, sin embargo, que no era muy capaz de pensar. Pensar es olvidar diferencias, es generalizar, abstraer. En el abarrotado mundo de Funes no había sino detalles, casi inmediatos. Borges, Funes el memorioso, in Ficciones (2)
A Real Mesa Censória sob Pombal (Portugal, 1768-1777)
N
O INÍCIO DE
1777, poucos meses antes da morte de D. José I e
da queda do marquês de Pombal, um censor de nome António de Santa Marta Lobo da Cunha estava encarregado de examinar um livro impresso em Londres e “escripto na Lingua Franceza”. O título desse livro era L’An deux mille quatre cents quarante. A sua censura foi entregue no dia 13 de janeiro. Eram quatro páginas de caligrafia cuidadosa terminadas na véspera, nas quais o censor enumerara os defeitos da obra de forma sistemática e inequívoca (3). Existem muitas outras censuras em que se sente – por detrás de uma reprovação devida, burocrática, do censor – um tom de mal disfarçada admiração pelo virtuosismo do autor ou mesmo de interesse pelo conteúdo da obra. Não é, de todo, este o caso presente. O censor limita-se a abrir uma pequena excepção, condicional, para a originalidade da ideia que deu origem ao livro; mas o autor, mais que não a saber aproveitar, levou-a por caminhos condenáveis: “Porque quando a idea que se propós indicava hum bom filozofo, e ingenhoso Critico, acho que a doutrina toda he de um Deista extravagante e Monarchomaco reforçado.”
Resistamos por agora à tentação de comentar esta frase e nomeadamente de nos perguntarmos que fazem aqui estes dois termos, “crítico” e, acima de tudo, “filósofo”, empregue de forma não-pejorativa, e deixemos o censor explicar-se melhor:
ESTUDOS AVANÇADOS 13 (37), 1999
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“Para o seu Author formar o plano desta Obra entrou no enthusiasmo de