hermafrodito
Assim pensava a ninfa Salmácis, reclinada na relva, à beira de um regato. Com a cabeça apoiada numa das mãos, a jovem alisava o tapete esverdeado c: solo, arrancando pequenos pedaços de grama. Depois, lançava-os indolentemente à água, após estudá-los de todos os modos. Salmácis gastava ainda um tempo infinito no restante desta importante ocupação, acompanhando a minúscula odisséia do pequeno talo verde que navegava na corrente do rio até desaparecer da sua vista, misturado aos outros pequenos detritos que vagam na superfície das águas. Às vezes, no entanto, fingia ser ela mesma esse pequeno talo. Deitada sobre o curso da água, boiava, deixando que a corrente a levasse aonde quisesse. Enquanto ia assim navegando, de costas sobre a agua, Salmácis sentia-se flutuar, liberta de tudo.
Via ao alto as nuvens avançarem com ela, enquanto pequenas andorinhas voavam em círculo no grande azulejo invertido do céu. Às vezes o sol, por entre os galhos da vegetação das margens, obrigava-a a fechar momentaneamente os olhos. Então, a coisa mais facil do mundo para Salmácis era acordar, de repente, quase desaguando ao mar, junto com as águas do rio.
Nesse momento, seus ouvidos ainda podiam escutar as vozes de suas companheiras, que se afastavam na outra margem comentando algo num tom raivoso.
— Invejosas! — disse Salmácis, colando, aborrecida, a face direita na relva. Tinha certeza de que falavam mal dela, pois havia pouco tempo tivera uma irritante discussão com as ativas e incansáveis colegas. Discussões, mais do que qualquer outra coisa, aborreciam-na profundamente. Simplesmente não conseguia imaginar como duas pessoas podiam se desentender num lugar maravilhoso como aquele.
— Vamos lá, preguiçosa! —