gua de Meninos acabou?
Geraldo Sarno, nas décadas de 1960 e 1970, dirigiu uma série de documentários sobre o universo que é o sertão brasileiro, um mundo que até hoje tem privilegiada visão das costas e da nuca dos “mulatos neurastênicos do litoral”. Nestes documentários - a grande maioria curtas metragens - o diretor apreciado por Glauber Rocha mostra, em um sentido introdutório sobretudo para a minha geração, a vida cultural e social do lado de lá do Brasil, as feiras, crenças e os festejos. Este retrato traz em si muito mais que o aspecto pitoresco que o passado e o lugar infrequentado poderiam gerar, isso graças às mãos cuidadosas do diretor.
José Carlos Capinam compôs para o segundo disco de Gilberto Gil, Louvação, de 1967, a canção intitulada Água de Meninos. Nesta canção, descreve o poeta a ascensão e a queda de uma das mais famosas feiras que ocorreram no Nordeste brasileiro e como isso se refletia na vida de um homem comum, ligado não só utilitariamente a ela, mas também subjetivamente.
(Nota-se que, aqui, “feira” tem um sentido que passa muito ao largo do que se conhece hoje com este nome: as feiras nordestinas marcavam um dos locais mais importantes do convívio e da vida social da região, reuniam produtos dos mais diversos tipos e das mais diversas origens, simbolizavam o encontro de moradores de localidades geograficamente afastadas, mas que iam abastecer-se de gêneros que escasseavam em outras partes. Deste hábito antiquíssimo se pode observar a Feira de Caruaru, a expansão de Feira de Santana (limite histórico entre a capital e o sertão baianos) e, claro, Água de Meninos.)
As visões de Sarno e Capinam se encontram, assim, na expressão de um modo de vida que já não existe. Água de Meninos era uma feira que reunia toda a produção do Recôncavo Baiano, que chegava a Salvador em pequenas embarcações, como saveiros; era um local habitado não só pelo comércio, mas pela vida cultural, pelo sincretismo e pela naturalidade das relações humanas. Ao lado