Etica
RSP
Ensaio
Interesse, ética e política no serviço público *
Cicero Araujo
Introdução Já faz algumas décadas que a Ciência Política vem transpondo para seu campo de investigação o paradigma do homo oeconomicus – a psicologia egocêntrica utilizada pela teoria econômica convencional para dar conta das interações sociais no mercado. “Seu campo de investigação”, isto é, o comportamento de atores coletivos, como os partidos, os sindicatos e os gabinetes governamentais, ou de atores individuais, como as lideranças partidárias, os parlamentares, os eleitores, etc. Para o assunto que nos interessa aqui, houve grande impacto, no debate posterior, o uso que se fez do paradigma econômico para entender certos problemas da administração pública e da ação coletiva. Os estudos de Buchanan e de Olson Citamos duas linhas de trabalho que, ainda na década de 1960 e no início da de 1970, tiveram forte influência na compreensão contemporânea das burocracias
Revista do Serviço Público Brasília 56 (3): 309-320 Jul/Set 2005
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Ensaio: Interesse, ética e política no serviço público
estatais, e das dificuldades do cidadão comum para mantê-las sob controle e fazêlas prestar os serviços a que são destinadas. Começamos mencionando os estudos de James Buchanan e associados1, cujas conclusões apontam, primeiro, para a tendência, especialmente nas democracias, de expansão desenfreada de serviços à custa dos contribuintes, não tanto para beneficiar a sociedade, mas como forma de garantir a reprodução das próprias burocracias; e, segundo, a tendência para a “busca da renda particular” (rent-seeking), alvejando a mística do funcionário como promotor imparcial do bem comum. Esses estudos mostram os servidores estatais como um grupo de interesse à parte – não um simples lobby entre outros, mas um grupo colocado numa posição especial, já que detentor de certos monopólios legais, exatamente por fazer parte do Estado – sempre disposto a transformar em