Eros E Psique
…E assim vedes, meu Irmão, que as verdades que vos foram dadas no Grau de Neófito, e aquelas que vos foram dadas no Grau de Adepto Menor, são, ainda que opostas, a mesma Verdade.
Do ritual do Grau de Mestre Do Átrio na Ordem Templária de Portugal
Conta a lenda que dormia
Uma princesa encantada
A quem só despertaria
Um infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa adormecida,
Se espera, dormindo espera.
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado.
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino —
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E, vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora.
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
Fernando Pessoa
Aspetos introdutórios
Apesar da dificuldade em delimitar, sem zonas cinzentas, a produção de Fernando Pessoa heterónimo e ortónimo, não parece problemática a atribuição desta composição poética a este último. Os aspetos formais, o estilo e a matéria integram-se bem na conceção que o ortónimo tinha do texto poético e das temáticas que a sua produção desenvolve.
De facto, a poesia ortonímica «distingue-se, em primeiro lugar, da poesia de cada um dos heterónimos, pelo estilo e pelas características formais: uso de rima, de métrica e composição estrófica regulares, musicalidade, recurso a formas consagradas (…)» (Silva, 2008: 649). Tudo aspetos que Eros e Psique testemunha, identificando-o, do ponto de vista formal, com a lírica tradicional.
No que se refere à matéria, a atração pelo oculto, pelo