dessacralização em Caim, de José Saramago
Carolina de Aquino Gomes
RESUMO: O romance Caim se enquadra, de acordo com Ana Paula Arnaut, numa terceira fase da produção literária de José Saramago, caracterizada como a dos romances fábulas, em que se percebe na narrativa uma comicidade mais englobante e por consequência uma maior leveza tanto na escolha dos temas quanto no modo como o relato é construído. Em Caim, Saramago apresenta uma visão bem humorada e dessacralizadora de algumas narrativas bíblicas, revisitando episódios que se confrontam com a tradição cristã, tornando o discurso cômico e, por vezes, questionador da conduta divina. Desde a revisitada história da expulsão de Adão e Eva do paraíso, pode-se perceber que Deus é retratado de forma mais humana. Para esse efeito, o autor mantém, sobretudo, uma linguagem cômica que leva os leitores ao riso ou ao estranhamento do sagrado retratado por Saramago. Perante esse quadro, propõe-se uma análise dos efeitos cômicos em Caim, de José Saramago, com base nos três conceitos de comicidade trabalhados por Henri Bergson, como os cômicos de situação, de palavras e de caráter. Ao verificar a maneira como o riso ácido de Saramago recai sobre as tradicionais histórias bíblicas, percebe-se um efeito discursivo que confirma a célebre máxima de Molière, “ridendo castigat mores”, pois o riso leva o homem a refletir criticamente diante da realidade e a repensar pontos de vista ético-morais.
Palavras-chave: Cômico, Religião, Ideologia.
O sagrado é uma temática recorrente nos romances de José Saramago e os questionamentos acerca do divino iniciados em Evangelho Segundo Jesus Cristo ganham nova abordagem em Caim. Enquanto no primeiro, observa-se um tom mais solene na reconstrução das histórias do Novo Testamento, o último romance publicado por José Saramago, elabora um discurso cômico e cáustico, numa paródia do Antigo Testamento, em que, por intermédio das visões privilegiadas de Caim e do narrador, observam-se