Democracia
O
s limites e dilemas que enfrenta hoje o processo de construção democrática têm sido objeto de um número significativo de análises. Uma parte expressiva delas enfatiza o que seria a derrota do que parecia ser um processo linear e ascendente na direção do avanço democrático, instalado a partir da chamada transição democrática, o período que se seguiu à ditadura militar. A revelação prática e contundente de que este processo enfrenta contradições, limites, dilemas, de que ele tem um ritmo desigual, que seu avanço, nas várias dimensões que o compõem, é heterogêneo e acidentado, parece nos fazer esquecer que a disputa política é ingrediente intrinsecamente constitutivo da construção e do aprofundamento da democracia. O que então, me parece, deve ser iluminado, mais do que um diagnóstico de que vivemos um momento totalitário, de anulação da política (Oliveira, 1999) é, precisamente, a disputa política, que insiste em se repor continuamente no interior desse processo.
A dinâmica da construção democrática dos anos 80, alimentada pela conjuntura favorável e pela visibilidade dos movimentos sociais, talvez tenha contribuído para uma visão simplificada do que seriam o desenrolar do processo e as dimensões da disputa que ele implica. Talvez tenhamos superestimado a força políti-
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Evelina Dagnino é Ph.D. em Ciência Política pela Universidade de Stanford, EUA e professora associada do Departamento de Ciência Política da Universidade de
Campinas, S. Paulo. Endereço: R. Jorge Hennings, 1015. Campinas 13073-420 São Paulo. E-mail: evelina@unicamp.br.
Artigo
Construção democrática, neoliberalismo e participação: os dilemas da confluência perversa
N• 5 – outubro de 2004
ca de um dos lados dessa disputa, minimizando os obstáculos que encontraria e o poder dos adversários. Reconhecer e expor a permanência dessa disputa, examinar de modo detido as suas características, esse me parece ser o procedimento que pode, talvez,