O filósofo Aristóteles de Estagira prescinde de qualquer nota biográfica. É quase uma lenda. Contam que suas últimas palavras, segundos antes de morrer, fora uma exclamação lacônica e sentimental. Oh! Meus amigos, não há amigos!... É difícil acreditar que o inventor da lógica formal, um homem que sabia ser a morte apenas um acidente na sua eterna e incorruptível substância pudesse tecer em momentos tão relevantes um comentário patético como este. Muitos atribuem essa passagem ao tecido de lendas envolvendo o seu cadáver, mas não seria completamente inverossímil a autenticidade destas palavras, supondo serem elas a conclusão de premissas não estabelecidas. Aristóteles fora aluno de Platão e este possuía uma noção muito singular sobre a amizade. Platão era um paranóico, fora traído mais de uma vez pelo tirano de Siracusa, seu amigo; fora vendido como escravo. Sabia que entre a plebe a palavra empenhada não asseguraria a ordem do estado e que leis arbitrárias só poderiam funcionar como delegadas de valores sagrados. Criou então o mundo das idéias. Os homens matam-se por dinheiro, honra e mulheres, mas as idéias podem ser pacificamente comungadas por todos e era na comunhão das idéias, na koinonia, que ele buscava fundamentos para a amizade. Mesmo entre os facínoras, dizia pela boca de Sócrates, impera a idéia de justiça ao partilharem a pilhagem. Aristóteles não acreditava no mundo das idéias, estava muito velho para lembrar-se desse mundo originário. Nem ele nem o seu mestre foram capazes de pensar a amizade como afeto. Sua versão epistemológica das idéias, o conceito, tinha nuanças excessivamente psicológicas para serem comungadas impessoalmente. Diante de uma Grécia decadente e invadida, penso que Aristóteles sentiu saudades do seu mestre ao externar seu último e melancólico enunciado. Um pedaço do céu platônico, estas palavras, que na ausência basilar das premissas, desabou sobre ele como uma lápide - uma sentença lapidar!
Muito mais humoradas foram as últimas