Análise - Manuel Bandeira, Pensão familiar
Pensão Familiar
Jardim da pensãozinha burguesa.
Gatos espapaçados ao sol.
A tiririca sitia os canteiros chatos.
O sol acaba de crestar as boninas que murcharam.
Os girassóis amarelo! resistem.
E as dálias, rechonchudas, plebéias, dominicais.
Um gatinho faz pipi.
Com gestos de garçom de restaurant-Palace
Encobre cuidadosamente a mijadinha.
Sai vibrando com elegância a patinha direita:
– É a única criatura fina na pensãozinha burguesa.
Petrópolis, 1925.1
Libertinagem, de Manuel Bandeira, lançado em 1930, é o livro no qual foi publicado Pensão Familiar (1925) e caracteriza-se por ser o primeiro livro totalmente modernista do autor, podendo-se notar a intenção do poeta de quebrar com as formar tradicionais acadêmicas.
Após a Semana de Arte Moderna, foi buscado o lirismo liberto dos moldes poéticos, e Bandeira, um dos participantes ativos do movimento, passou a amadurecer seu estilo e rompeu com o Parnasianismo, movimento que “se articulou com o pedantismo gramatical e o rebuscamento da linguagem”2 e “completamente desinteressado da ação política e social”3.
O título do livro representa sua ruptura de valores, além do uso de novas ideias e do desregramento de costumes, onde “recolheu a parte mais radical da sua poesia modernista”4.
A construção de Pensão Familiar é caracterizada pela crítica social e há necessidade de rigorosa atenção a fim de chegar ao significado de seu todo.
2
A primeira libertação do poema, que pode ser vista, é a sua forma. Em contraste com o Parnasianismo, que propunha uma estética rígida, milimétrica, em conjunto com o uso de palavras arcaicas ou cultas, o poema apresenta versos brancos, métrica irregular, quebras repentinas dos versos, entre outros que serão analisados abaixo.
O poema, por um lado, apresenta uma dessonorização, pela aparente ausência de efeitos sonoros e homofonia, aproximando-se de um aspecto “da sonoridade normal e mais discreta da prosa”5, mas, pelo outro, sua disposição gráfica,