Um cão galopa pelas ruas, e atrás dele corre um rapaz. Uma longa corda une os dois e se embaraça nas pernas das pessoas, que ficam passando de um lado a outro, e se irritam e xingam; o rapaz murmura sem parar: “Desculpe, desculpe”, e, em meio às desculpas, grita para o cachorro: “Pare! Stop!”, e uma vez, cúmulo da vergonha, escapa-lhe também um “Porra!”. E o cachorro continua correndo. Ele voa, cruza ruas cheias de tráfego e ultrapassa sinais fechados. Seu pêlo amarelo some da vista do jovem e reaparece entre as pernas dos transeuntes, como sinais de um código. “Mais devagar”, grita o rapaz, e pensa que poderia chamá-lo pelo nome se soubesse qual é, e talvez então o cão parasse de correr, ou ao menos diminuísse a velocidade; mas, no fundo do coração, ele sente que ainda assim o cachorro continuaria correndo e, mesmo que a corda aperte seu pescoço até sufocar, ele vai correr desenfreadamente até o local aonde quer chegar, e tomara que cheguemos mesmo, e que ele finalmente me solte. Tudo isso acontece numa época não muito boa. O jovem, Assaf, corre para a frente, mas seus pensamentos ficam para trás, encalhados; ele não quer pensar, precisa se concentrar totalmente na correria do cachorro, sente que os pensamentos vão se arrastando atrás dele como uma corrente de latas enferrujadas. A lata da viagem de seus pais, por exemplo. Neste exato momento estão sobrevoando o oceano, pela primeira vez na vida viajam de avião, afinal por que tiveram de viajar tão de repente? E a lata da sua irmã mais velha, em quem ele simplesmente tem medo de pensar, pois dali só saem problemas; e há outras latas, pequenas e grandes, que ficam batendo umas nas outras dentro de sua cabeça, e, lá no final da corrente, vai se revirando a lata que se arrasta atrás dele já há duas semanas; o som que ela faz o deixa maluco, é um ruído infernal, insistindo que ele tem de se apaixonar loucamente por Dafi, pois, afinal, por quanto tempo é possível adiar? E Assaf sabe que precisa parar um momento,