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Arte e inveja − relações entre amor e ódio, clínica e política na era do vazioA reflexão contida neste artigo foi instigada pelas análises de alguns artistas nas quais observei a presença da inveja e de suas implicações nos processos criativos por eles desenvolvidos. O trabalho que apresentei recentemente em reunião científica da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo contém material clínico relativo a essa problemática (Frayze-Pereira, 2011). Entretanto, porque as situações clínicas das quais partimos envolvem o campo da arte – os analisandos são artistas profissionais –, essa reflexão precisou fundamentar-se não apenas nas teorias psicanalíticas, mas também na filosofia, na estética e na história da arte que com elas podem se articular. Assim, considerando o contexto histórico da cultura contemporânea que, desde a obra de Lipovetsky (2005), ficou conhecido como “era do vazio”, interrogo a possibilidade de a arte fazer frente à cultura do vazio e constituir um campo de tensão permanente na relação com a inveja, que é um sentimento esterilizante da curiosidade e um dos determinantes da indigência psíquica de nosso tempo.
Nesse sentido, entre os críticos de arte atuais, que buscam algum suporte teórico na psicanálise, destaca-se Hal Foster (1996), que privilegia a noção freudiana de “trauma”, pois implica situações excessivas do ponto de vista emocional, marcadas por dois aspectos importantes, violência e repetição, encontrados na arte contemporânea desde as suas primeiras manifestações. Nos anos 1960, tais aspectos já podem ser observados em inúmeras obras de Andy Warhol como, por exemplo, na serigrafia que apresenta uma cadeira elétrica vazia [ex.: Lavender disaster, 1963, em que a imagem é repetida quinze vezes como se fossem fotogramas] e, duas décadas depois, também nos trabalhos de Cindy Sherman, que repetidamente apresentam a imagem da mulher em cenas de excesso e abuso que primam pelo antiglamour [ex.: Untitled 153, 1985, em que o corpo da