''Quem ama exerce deus'': manoel de barros e o livro sobre nada, por dra. patricia de vasconcelos-pavas
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"QUEM AMA EXERCE DEUS": MANOEL DE BARROS E O LIVRO SOBRE NADAProf. Dra. Patrícia de Vasconcelos-Pavas
O poeta do pantanal escreve agora a partir do nada. Este é o tema central de sua última obra, Livro Sobre Nada (1996), publicado pela Editora Record. Mas o que o autor chama de nada? Manoel parte do escritor francês Gustave Flaubert para delimitá-lo (se é que isso é possível): ''[Flaubert] queria o o livro que não tem quase tema e se sustenta só pelo estilo. Mas o nada de meu livro é nada mesmo. É coisa nenhuma por escrito: um alarme para o silêncio.'' A menos que sua obra toda seja uma imensa reflexão sobre o nada, Manoel de Barros parece blefar. Afinal, Livro Sobre Nada aborda os temas e imagens recorrentes, como os pequenos animais, árvores, pedras e personagens desviantes. A primeira parte, Arte de Infantilizar Formigas, dá mostras de sua preferência pelos seres defeituosos, marginais, como reflete o seguinte trecho: ''Prefiro as linhas tortas, como Deus. Em menino, eu sonhava de ter uma perna mais curta (só pra poder andar torto)''. Logo no primeiro verso do livro, aparece um traço forte de sua obra: ''As coisas tinham para nós uma desutilidade poética." O autor costuma usar o prefixo ''des'' para acentuar a sua mania/obsessão por limpeza mental, consequentemente, também linguística. Através desse prefixo, Manoel de Barros explicita a sua influência zen-budista. Aliás, a influência do Zen também aparece pela eleição dos seres mínimos.
ORIENTALISMO A leitura oriental da obra de Manoel de Barros, e especialmente do Livro Sobre Nada, não se restringe a um ou dois aspectos. Todo o seu processo criativo é inspirado na imagem de Buda sob a forma do redentor da humanidade. Os adeptos chamam essa forma de bodhisattva. O bodhisattva do seu último livro não elege apenas a compaixão, a imagem do nada é o seu principal atributo. O nada não é o nada ocidental, mas o próprio útero do universo, onde todas as coisas