O descabaço das virgens da província de Montpellier
2075 palavras
9 páginas
No terceiro capítulo, nomeado “Um burguês organiza seu mundo: a cidade como texto”, Darnton utiliza a descrição de Montpellier feita, em 1768, por um cidadão anônimo e membro da burguesia local para explicar o que a vida urbana significava para ele. Ele começa a sua análise com a seguinte pergunta: o que é descrever um mundo? Não cabe a nós descobrir qual o verdadeiro aspecto de Montpellier em 1768, mas sim entender como esse burguês o observava. A partir da análise da Description, obra de nosso montpelliense, podemos visualizar três leituras da sociedade: a primeira é a apresentação de Montpellier, a partir de uma procissão de dignitários, através do qual representava toda a hierarquia da cidade, exagerando grosseiramente a importância de alguns grupos e se esquecendo inteiramente de outros; a segunda foi através da tradicional divisão em estados, fazendo jus ao caráter corporativo da sociedade, considerando apenas uma prestidigitação com cada categoria; e a terceira é uma descrição da cultura urbana, revelando a maneira de viver das pessoas, que acabava fazendo uma apologia ao estilo de vida burguês, que para ele significava “viver de rendas e anuidades, sem exercer qualquer profissão.”[10] Darnton considera que cada uma das três vias continham contradições e contradiziam umas as outras, surgindo aí a magnitude do documento e da visão de mundo de seu autor, que pela necessidade de entender esse mundo, descreveu durante centenas de páginas de seu livro a cidade em que vivia, sem conseguir encontrar a maneira adequada para fazer isso. Mesmo possuindo um pouco mais de liberdade que seus semelhantes ingleses, os camponeses franceses ainda “não podiam escapar a um sistema senhorial que lhes negava terras suficientes para alcançarem a independência econômica, e que lhes sugava qualquer excedente por eles produzido.”[4] Para a maioria dos camponeses a vida significava lutar para se manter acima da linha que separava os pobres dos indigentes. Era uma luta diária contra