o artesanato
São Paulo, domingo, 15 de agosto de 2004
Em Maragogipinho, técnicas de cerâmica passam de pais para filhos
"Cada peça é um pouco da gente"
DO ENVIADO ESPECIAL A MARAGOGIPINHO (BA)
"Painho, assim tá bom?", pergunta o menino Rodrigo Mota, 12, que, com as mãos sujas de barro, finaliza uma galinha arrepiada. "Bote um [pedaço] menor", responde o pai, enquanto trabalha no torno, fazendo caxixis (utensílios em tamanho reduzido feitos para crianças).
A conversa aconteceu na olaria de Reinaldo Mota, 44, o Penso, que produz peças em cerâmica com a ajuda da mulher e dos três filhos. "Comecei aos 10 anos. Meu pai me deu as dicas", lembra o artesão.
A olaria de Penso é apenas uma das cerca de 70 existentes em Maragogipinho, no Recôncavo Baiano, comunidade considerada o maior centro de cerâmica da América Latina.
No vilarejo, cercado pelo manguezal às margens do rio Jaguaripe, todos tiram seu sustento do artesanato, afirma a associação local de oleiros. Seja no tratamento da matéria-prima, na produção ou na pintura das peças, há mais de um século, as técnicas são herança de família.
Amassador de barro, Jaimilson dos Santos Souza, 17, conta que precisa "cumprir cinco tarefas" por semana. Cada tarefa corresponde a 14 blocos de argila, tirada da terra com enxada, e é remunerada com R$ 6. O trabalho todo é feito à tarde. "De manhã, estou na escola", avisa.
Filha de um comerciante de artesanato, Janildes Santana Duarte, 50, aprendeu ainda pequena a aplicar sobre a cerâmica a pintura de tabatinga (espécie de argila da cor branca). Para pintar, utiliza pincéis de pêlo de gato feitos por ela mesma. "Gato novinho não presta, tem de ter mais de ano. E, se for malhado, dá pincel melhor", ensina.
Desempregado há 13 anos, o artesão Edemilson de Oliveira, 45, diz que a atividade virou fonte de sobrevivência. "Trabalho com isso desde que comecei a me entender. Cada peça é um pouco da gente." (BL)