SERX
Encontro pessoas que mal falavam comigo, porque achavam que eu não gostava delas. Já eu não me aproximava, por achar que não gostavam de mim!´
Chego em casa à noite, exausto. A mesa vazia. Nada sobre o fogão. Nem no forno. Nem na geladeira. Não há jantar. Pior, os ovos, sempre providenciais, acabaram. Sou forçado a me contentar com um copo de leite e bolachas.
No dia seguinte, revolto-me diante da empregada.
- Passei fome! TT
- Ih! Achei que o senhor não vinha jantar!
Solto faíscas que nem um fi o desencapado, ao ouvir o verbo ³achar,´ em qualquer conjugação. É um perigo achar. Não no sentido de expressar uma opinião, mas de supor alguma coisa.
Tenho trauma, é verdade. Tudo começou aos 9 anos de idade. Durante a aula, fui até a professora e pedi:
- Posso ir ao banheiro ?
Ela não permitiu. Agoniado, voltei à carteira.Cruzei as pernas. Cruzei de novo. Torci os pés. Impossível escrever ou ouvir a lição. Senti algo morno escorrendo pelas pernas. Fiz xixi nas calças! Alguém gritou:
- Olha, ele fez xixi!
Dali a pouco toda a classe ria. E a professora, surpresa:
- Ih... eu achei que você pediu para sair por malandragem !
Vítima infantil, tomei horror ao achismo´. Aprendi: sempre que alguém acha ´alguma coisa, acha´ errado.
Meu assistente, Felippe, é mestre no assunto.
- Não botei gasolina no carro, porque achei que ia dar! — explica, enquanto faço sinais na estrada, tentando carona até algum posto. É proibido achar Inocente não sou. Traumatizado ou não, também já achei mais do que devia.
Quase peguei pneumonia na Itália, por supor que o clima estaria ameno e não precisaria levar roupa de inverno.
Palmilhei mercadinhos de cidades desconhecidas, por imaginar que hotéis ofereceriam pasta de dente.
Deixei de ver filmes e peças, por não comprar ingressos com antecedência, ao pensar que estariam vazios.
Fiquei encharcado ao apostar que não choveria, apesar das previsões do tempo.
Viajei quilômetros faminto, por ter certeza de que