portugues
Amor é um fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói, e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se e contente;
É um cuidar que ganha em se perder;
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata, lealdade.
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Um mover d'olhos brando e piadoso
Um mover d’olhos brando e piadoso,
Sem ver de quê ; um sorriso brando e honesto, quási forçado; um doce e humilde gesto, de qualquer alegria duvidoso;
Um desejo quieto e vergonhoso; um repouso gravíssimo e modesto; ũa pura bondade, manifesto indício da alma, limpo gracioso;
Um escolhido ousar; ũa brandura; um medo sem ter culpa; um ar sereno; um longo e obediente sofrimento:
Esta foi a celeste formosura da minha Circe, e o mágico veneno que pôde transformar meu pensamento.
O texto é constituído por duas quadras e dois tercetos, em metro decassilábico, com um esquema rimático : ABBA///ABBA//CDE//CDE verificando-se a existência de rima interpolada em a, emparelhada em b e interpolada em cde. O soneto apresenta um retrato da mulher amada, onde se dá maior relevo aos traços morais. O conjunto de qualidades que lhe é dado tende a produzir uma imagem de perfeição e a não individualização da mulher. Este poema está dividido em duas partes lógicas. A primeira parte é as duas quadras e o primeiro terceto e corresponde à acumulação de atributos físicos e morais da figura feminina. Assim, são feitas referências ao “mover d’olhos”, ao “sorriso”, ao “gesto”, às quais são sempre atribuídas qualidades morais: “Um mover d’olhos brando e piadoso,”, “um sorriso brando e honesto,” e “um doce e humilde gesto,”. A segunda parte é ultimo terceto e corresponde à síntese de