Poesias Literarias

624 palavras 3 páginas
A TECELÃ
Mauro Mota
Toca a sereia na fábrica, e o apito como um chicote bate na manhã nascente e bate na tua cama no sono da madrugada.Ternuras da áspera lona pelo corpo adolescente.
É o trabalho que te chama.
Às pressas tomas o banho, tomas teu café com pão, tomas teu lugar no bote no cais do Capibaribe.

Deixas chorando na esteira teu filho de mão solteira.
Levas ao lado a marmita, contendo a mesma ração do meio de todo o dia, a carne-seca e o feijão.

De tudo quanto ele pede, dás só bom-dia ao patrão e recomeças a luta na engrenagem da fiação.

Ai, tecelã sem memória, de onde veio ese algodão?
Lembras o avô semeador com as sementes na mão e os cultivadores pais?
Perdidos na plantação ficaram teus ancestrais.
Plantaram muito. O algodão nasceu também na cabeça, cresceu no peito e na cara.

Dispersiva tecelã, esse algodão, quem colheu?
Tuas pequenas irmãs, deixando a infância colhida e o suor infantil e o tempo na roda da bolandeira para fazer-te fiandeira.

Ai, tecelã perdulária, esse algodão, quem colheu?
Muito embora nada tenhas, estás tecendo o que é teu.

Teces tecendo a ti mesma na imensa maquinaria, como se entrasses inteira na boca do tear e desses a cor do rosto e dos olhos e o teu sangue à estamparia.

Os fios dos teus cabelos entrelaças nesses fios, e outros fios dolorosos dos nervos de fibra longa.

Ó tecelã perdulária, enroscas-te em tanta gente com os ademanes ofídicos da serpente multifária.
A multidão dos tecidos exige-te esse tributo.
Para ti, nem sobra ao menos um pano preto de luto.

Vestes as moças da tua idade e dos teus anseios, mas livres da maldição do teu salário mensal, com o desconto compulsório, com os infalíveis cortes de uma teórica assistência, que não chega na doença, nem chega na tua morte.

Com essa policromia de fazendas, todo dia, iluminas os passeios, brilhas nos corpos alheios.

E essas moças desconhecem o teu sofrimento têxtil,
teu

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