olavo carvalho
O silêncio dos mortos como modelo dos vivos proibidos de falar.1 In Olavo de Carvalho, O Futuro do Pensamento
Brasileiro: Estudos sobre o nosso lugar no mundo, 2a. edição,
Rio de Janeiro, Faculdade da Cidade Editora, 1997, pp. 82-111. Devo começar por fazer recordar aos franceses aqui presentes uma citação do eminente médico brasileiro Vital Brasil, que, na ocasião de falar pela primeira vez a um público de língua francesa, disse: “Peço que me perdoeis pelos danos que eu venha a fazer à gramática, porque estou falando numa língua que não é a minha e que, como o percebereis em poucos instantes, talvez não seja tampouco a vossa.”
Meu único consolo que me traz a presente circunstância de um diálogo plurinacional é a de poder imaginar que talvez alguns dos africanos, asiáticos e americanos que me escutam terminarão por acreditar que vos falo em francês.
O assunto que pretendo sugerir às vossas meditações vos parecerá talvez estranho. Num colóquio dedicado aos sofrimentos dos homens, mulheres, crianças e velhos submetidos a injustas exclusões e discriminações, é dado por pressuposto que se fale sempre de minorias que protestam da justeza de sua causa, para fazer valer seus direitos. O grupo excluído do qual pretendo vos falar é, ao contrário, composto da vasta maioria da espécie humana. Pior ainda, ele se compõe apenas de pessoas que não protestam jamais, que não se exprimem nunca senão por um silêncio que com demasiada facilidade tomamos como sinal de indiferença ou aprovação. Pretendo falar-vos dos mortos, dos homens dos tempos passados. Embora sendo verdade que eles são as mais inermes de todas as criaturas, eles não teriam o que fazer neste colóquio se sua exclusão do diálogo humano não fosse, no meu entender e segundo vos pretendo mostrar se mo permitirdes, o modelo mesmo, o arquétipo de todas as formas modernas de exclusão e de discriminação.
Há muitos traços que delineiam nosso século com um perfil que o