A crença numa entidade maligna que constantemente nos induz ao erro é uma maneira cômoda de nos escusarmos da responsabilidade das conseqüências das nossas atitudes, já que se somos impelidos por tal entidade a cometer erros, então não podemos ser responsáveis por aquilo que nos acontece, de bom ou de mal. Também a crença num Deus que seja responsável por tudo que nos acontece, de bom ou de mal, é outro aspecto da mesma maneira de nos eximirmos da responsabilidade dos nossos atos. Também atribuirmos a outras pessoas nossos fracassos (ou nossos êxitos) é outro aspecto da mesma tendência que temos de desculpar-nos da responsabilidade dos nossos atos. Mas em qualquer desses casos o que prevalece é a tendência a crermos que uma entidade maligna dirige a nossa vida de uma maneira irresistível; assim, se hoje eu fracasso nos meus empreendimentos, eu atribuo este fracasso a uma infância infeliz, caracterizada pelo abandono ou pela hostilidade. Se bem que este abandono ou esta hostilidade possam ter existido, muitas vezes não passam de frutos da imaginação; por outro lado, nos casos em que elas efetivamente existiram, muitas vezes são perfeitamente superadas, ou pela educação proporcionada pela família, pela auto-educação ou pela psicoterapia ou outro tratamento de uma neurose. No caso, a entidade maligna teria sido a infância infeliz, caracterizada pela presença (ou ausência) de uma pessoa importante para a criança, e esta pessoa, no intimo da criança, passa a ser concebida como originada na ação da tal entidade maligna. A partir de uma infância infeliz ou supostamente infeliz passamos então a atribuir nossos fracassos a esta infância, particularmente, à ação daquela pessoa, encarnação de um espírito maligno. Então, se fracassamos no casamento ou na vida profissional, é fácil colocarmos a culpa em outras pessoas, e, em ultima analise sobre a nossa má sorte que nos foi proporcionada pelo tal espírito maligno. Não é minha intenção dizer que não existem pessoas perversas,