Fichamento: IN: BAGNO, M. Dramática da Língua Portuguesa. Tradição gramatical, mídia exclusão social. São Paulo. Loyola, 2000.
1- Gramática Tradicional e senso comum
1.1 Gramática tradicional, gramática normativa e preconceito linguístico
O preconceito linguístico manifesta (em suas diversas formas, nas distintas faces que assume) a ideologia cristalizada há séculos na Gramática Tradicional (GT) e materializada, por assim dizer, no gênero literário conhecido como gramática normativo (GN). Faço a distinção entre Gramática Tradicional e gramática normativa usando uma metáfora simples e nada original: a GT é a “alma” de um “corpo” chamado gramática normativa. Com Descartes falaríamos de “espírito” (GT) e “matéria” (GN). Por isso as gramáticas normativas podem diferir, e diferem, uma das outras, apresentando mudanças ao logo do tempo, quando comparadas no nível do gênero literário, e também variações idiossincráticas, quando comparadas entre si como obras individuais. No entanto, o “espírito” que as move, a GT, é o mesmo. A GT, por consubstanciar uma ideologia (como o sentido de visão de mundo ou conjunto de ideias dominantes numa sociedade, imposto pelas classes sociais que detêm o poder político e econômico), não tem autor, ao contrário das gramáticas normativas, às quais podemos nos referir como “gramática de Celso Cunha”, “a gramática de Rocha Lima”, “a gramática de Cegalla”etc.
Minha análise visa demonstrar que essa instrumentalização da GT como suporte do “discurso político e administrativo” não se interrompeu com o fim da Idade Média, permanecendo viva e forte até os dias de hoje, ao menos no que diz respeito à sociedade brasileira.
Antes de prosseguir, quero insistir na distinção entre o que é GT e o que são os usos que se faz dela, para que minha argumentação não corra o risco de parecer uma tentativa de demolição radical da GT. A Gramática Tradicional, não cabem dúvidas, é um patrimônio cultural do Ocidente, um monumento inestimável de saberes acumulados ao longo