Derrubando andaimes
A literatura em perigo (2009) de Tzvetan Todorov[2] faz uma crítica ao estudo de literatura, particularmente na França, apontando que a pesquisa e o ensino de literatura nas escolas e universidades tratam cada vez mais da forma do texto – a que gênero ele pertence, como se estrutura, qual seu estilo – e cada vez menos do sentido das obras. O equívoco é evidente: formam-se críticos literários antes mesmo de formá-los como leitores. Assim, “a cada vez mais, mas a partir de modalidades diferentes, é o mundo exterior, o mundo comum a mim e aos outros, que é negado e depreciado”.[3]
Tzvetan Todorov esboça um breve inventário sobre sua trajetória enquanto leitor e crítico literário e persegue, quase que arqueologicamente, a história dos olhares sobre a literatura ocidental para poder propor, primeiramente a si próprio e depois a seus leitores, uma nova abordagem da literatura, considerando principalmente aquilo que esta tem a dizer à sociedade, observado mais seus sentidos e menos suas estruturas formais, promovendo assim uma profunda ruptura inclusive com sua própria obra, o que requer grande honestidade e independência intelectual. Tal posição fica clara, por exemplo, no capítulo “A literatura reduzida ao absurdo”, onde Todorov discute o ensino de literatura no nível secundário francês e compara-o a um edifício em construção que, depois de pronto, deveria se ver livre dos andaimes, já que importa mesmo o prédio, sua arquitetura e funcionalidade.
Entretanto, o que se percebe nos estudos literários é a manutenção dos andaimes e a transformação destes em objeto de estudo; um equívoco reforçado a partir da segunda metade do século XX, não só pela crítica formalista, mas também por aquilo que Todorov chama de concepções niilistas e solipsistas da literatura (dado ambas repousarem “na ideia de que uma ruptura radical separa o eu e o mundo”), relativizando as verdades