OS RECURSOS PARA O BOM ADESTRAMENTO No início do século XVII, falava-se da “correta disciplina”, como uma arte do “bom adestramento”. O poder disciplinar é, com efeito, um poder que, não amarra as forças para reduzi-las; procura ligá-las para multiplicá-las e utilizá-las num todo. A disciplina “fabrica” indivíduos; ela é a técnica específica de um poder que toma os indivíduos ao mesmo tempo como objetos e como instrumentos de seu exercício, e um poder modesto, desconfiado, que funciona a modo de uma economia calculada, mas permanente. O sucesso do poder disciplinar se deve sem dúvida ao uso de instrumentos simples: o olhar hierárquico, a sanção normalizadora e sua combinação num procedimento que lhe é específico, o exame. O olhar é um aparelho onde as técnicas que permitem ver induzam a efeitos de poder, e onde, em troca, os meios de coerção tornem claramente visíveis aqueles sobre quem se aplicam, no decorrer da época clássica, são construídos esses “observatórios” da multiplicidade humana para as quais a história das ciências guardou tão poucos elogios. Esses “observatórios” têm um modelo quase ideal: o acampamento militar, que é de um poder que age pelo efeito de uma visibilidade geral, ou pelo menos o princípio do encastramento, de uma arquitetura que não é mais feita simplesmente para ser vista, mas para permitir um controle interior, articulado e detalhado para tornar visíveis os que nela se encontram. O aparelho disciplinar perfeito capacitaria um único olhar tudo ver permanentemente. Um ponto central seria ao mesmo tempo fonte de luz que iluminasse todas as coisas, e lugar de convergência para tudo o que deve ser sabido; olho perfeito a que nada escapa e centro em direção ao qual todos os olhares convergem. Mas o olhar disciplinar teve, de fato, necessidade de escala, a medida que o aparelho de produção se torna mais importante e mais complexo, a medida que aumenta o número de operários e a divisão do trabalho,as tarefas de controle se fazem mais