Artigo Ovido Baptista
(Estudo para compor o livro em homenagem ao Prof.
Egas Muniz de Aragão)
Ovídio A. Baptista da Silva
Professor nos Cursos de Mestrado e Doutorado da Unisinos
Professor titular (aposentado) de Direito Processual Civil da UFRGS.
1. Nossa formação jurídica, por força de uma longa tradição cultural, impõenos que pensemos o Direito através de conceitos, vendo-o constituído por fórmulas e regras, sem considerar que o direito existe nos fatos. Os livros jurídicos, mesmo aqueles escritos pelos processualistas, o grupo de juristas que, por dever de ofício, convivem com os problemas concretos da experiência judiciária, não devem indicar exemplos que possam ilustrar suas proposições teóricas. O exemplo, tendo de lidar, inevitavelmente, com fatos da vida real, faria com que os práticos forenses contaminassem a pureza da “ciência” jurídica que, enquanto conceitual, haveria de manter-se perene, como uma equação algébrica, ou as figuras geométricas. A Universidade, por sua vez, cuida apenas do direito “puro”, sem preocupar-se com os casos concretos (De “direito puro”, falou, há mais de um século foi
Edmond Picard (Le droit pure – Les permanence juridiques abstraites, Félix Alcan, Éditeur,
Paris, 1899), traduzindo, numa singela locução, o pressuposto teórico de todos os normativismos. 2. A separação entre “fato” e “direito”, entre a vida e a norma, que emerge dessa conduta metodológica, exerce importante influência quando buscamos separar os dois campos do fenômeno jurídico, o “direito material”, do direito processual. Na verdade, a radical separação entre “norma” e “fato” determina a redução do Direito apenas ao mundo normativo, concebendo-o, conseqüentemente, como uma entidade abstrata. O matemático, ao descrever uma equação de segundo grau, fica dispensado de demonstrar, através de um exemplo, que sua descrição é correta? Para o engenheiro, os cálculos continuarão corretos, mesmo que a ponte seja levada pela correnteza.