Ad Lia Prado
Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou: vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher, esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem, sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar, acho o Rio de Janeiro uma beleza e ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree, já a minha vontade de alegria, sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.
- Com licença poética
Biografia
Nascida em 1935 na cidade de Divinópolis,
Minas Gerais;
1950 morte da mãe e primeiros versos;
1958 casa-se com José Assunção de Freitas;
1970 - contato com Affonso Romano e
Drummond de Andrade;
1976 é lançado o livro “Bagagem”;
1978 ganha o premio Jabuti;
Movimento e estilo Literário
Escritora da literatura contemporânea;
Feminismo em primeiro plano;
Fé;
Versos simples e linguagem coloquial;
Cotidiano sob o olhar feminino;
Eroticidade de forma delicada e leve;
Trechos
AMOR FEINHO
Eu quero amor feinho.
Amor feinho não olha um pro outro.
Uma vez encontrado, é igual fé, não teologa mais.
Duro de forte, o amor feinho é magro, doido por sexo e filhos tem os quantos haja.
Tudo que não fala, faz.
Planta beijo de três cores ao redor da casa e saudade roxa e branca, da comum e da dobrada.
Amor feinho é bom porque não fica velho.
Cuida do essencial; o que brilha nos olhos é o que é: eu sou homem você é mulher.
Amor feinho não tem ilusão, o que ele tem é esperança: eu quero amor feinho
Deus é mais belo que eu.
E não é jovem.
Isto sim, é consolo.
Mulher é desdobrável. Eu sou.
Não tenho tempo algum. Ser feliz me
consome.