3 Apocalipse Z A Ira Dos Justos Manel Loureiro Doval
A IRA DOS JUSTOS
MANEL LOUREIRO DOVAL
Tradução Sandra Martha Dolinsky
Editora Planeta
2011
Este é para Rita e meus pais, por sua paciência e amor infinito. Obrigado por estarem sempre aí.
Se partires um dia rumo a Ítaca, faz votos de que teu caminho seja longo e repleto de aventuras, repleto de saber.
K. Kaváfis, Ítaca
Como quase todas as coisas, começou por puro acaso. Aquele pedaço do oceano Atlântico havia muitos meses não testemunhava nada excepcional. Durante o último ano e meio, apenas duas baleias e um pouco de lixo flutuante haviam cruzado aquele espaço de mar, situado em um ponto intermediário entre a América e a Europa.
Embora jamais houvesse se situado nas principais rotas de transporte marítimo, a ausência humana era mais notável que nunca. Nem um só barco, nem uma vela ou coluna de fumaça se vislumbrava no horizonte. Nada. Era como se o ser humano houvesse desaparecido da face da Terra. E, pensando bem, isso era exatamente o que havia acontecido.
Ou quase. Mas naquele ponto perdido no meio do mar não havia nada nem ninguém a quem aquilo importasse, ou que ao menos pudesse refletir sobre isso.
Porém, continuavam acontecendo coisas ali. No início, foi um pequeno aumento de temperatura, apenas uns quatro ou cinco graus. O sol de agosto estivera aquecendo a superfície da água durante vários dias seguidos, provocando uma evaporação invisível, mas constante. Todas aquelas toneladas de vapor de água foram subindo rapidamente à atmosfera, tão rápido que, à medida que subiam, esfriavam a toda a velocidade, transformando-se em uma densa camada de nuvens. Ao mesmo tempo, a pressão atmosférica começou a cair rapidamente, enquanto nas áreas circundantes o vento, impulsionado pela diferença de pressão e pela rotação da Terra, começava a se mover em gigantescos círculos preguiçosos, que adquiriam cada vez maior velocidade. Se algum meteorologista estivesse ali presente (coisa difícil, porque naquele
momento restavam vivos apenas uns quarenta