Ética dos Corruptos
Brasil -
Categoria: Reportagens
Publicado em Quarta, 28 Março 2012 23:45
Brasil - Envolverde - [Renato Janine Ribeiro] É ético um jornalista usar câmeras secretas para comprovar um crime que, depois, ele irá denunciar? Não discuto, aqui, a legalidade de sua ação, porque não tenho a formação jurídica necessária para me pronunciar sobre as leis e jurisprudência cabíveis no caso. Mas a questão adquire relevância diante do fato que movimentou a sociedade brasileira na semana que passou: a revelação, em imagens incontestáveis, de uma rede de corrupção atuando justamente nos hospitais – o que torna particularmente desumano o crime porque está sendo cometido contra pessoas especialmente vulneráveis. Isso, além de ser uma área em que cronicamente falta dinheiro, até porque os custos com a saúde costumam subir mais que a inflação, em parte devido aos grandes avanços que a medicina tem conhecido.
O que é flagrante é a falta de ética das pessoas que vimos no Fantástico e no Jornal Nacional. Os corruptos (vou chamá-los assim, embora tecnicamente não o sejam porque não são servidores públicos) não mostraram nenhum pudor. Imaginando-se a salvo, foram francos. Duas afirmações me chocaram em especial. Primeira, quando uma senhora diz que está praticando "a ética do mercado". Mas o que ela faz não é nada ético. A não ser, claro, que use "ética" num sentido apenas descritivo, como quando se diz que a "ética do bandido" é matar quem o alcagueta, ou que a "ética do machista" é assassinar a esposa suspeita de adultério. Contudo, um dos ganhos dos últimos anos tem sido a redução desse emprego da palavra "ética", só descritivo. Cada vez mais, entendemos a ética como prescritiva, normativa, como exigente – não como a mera descrição de condutas praticadas em alguma área da ação humana. Uma expressão de Claudio Abramo, frequentemente citada pelos profissionais da imprensa, é significativa: "A ética do jornalista é a mesma do marceneiro, de qualquer pessoa."