O que é escrever
Intuição, à própria linguagem: a decisão de comunicar aos outros os resultados obtidos. Em cada caso, é essa a decisão que cabe questionar. O bom senso que os nossos doutos tão facilmente esquecem, não se cansa de repeti-lo. Pois não é costume colocar para todos os jovens que se propõem a escrever; esta questão de princípio: "Você tem alguma coisa a dizer?”.
Por aí se deve entender: alguma coisa que valha a pena ser comunicada. Mas como compreender o que "vale a pena", se não recorrendo a um sistema de valores transcendente? Aliás, se considerarmos apenas essa estrutura secundária do empreendimento que é o momento verbal, o grave erro dos estilistas puros, é acreditar que a fala é apenas um zéfiro que perpassa ligeiramente a superfície das coisas, que as aflora sem alterá-las. E que o falante é pura testemunha que resume numa palavra sua contemplação inofensiva. Falar é agir; uma coisa nomeada não é mais inteiramente a mesma, perdeu a sua inocência. Nomeando a conduta de um indivíduo, nós a revelamos a ele; ele se vê. E como ao mesmo tempo a nomeamos para todos os outros, no momento em que ele se vê, sabe que está sendo visto; seu gesto furtivo, que dele passava despercebido, passa a existir enormemente, a existir para todos, integra-se no espírito objetivo, assume dimensões novas, é recuperado. Depois disso, como se pode querer que ele continue agindo da mesma maneira? Ou irá perseverar na sua conduta por obstinação, e com conhecimento de causa, ou irá abandoná-la. Assim, ao falar, eu desvendo a situação por meu próprio projeto de mudá-la; desvendo-a a mim mesmo e aos outros para mudá-la; atinjo-a em pleno coração, traspasso-a e fixando-a sob todos os olhares; passo a dispor dela; a cada palavra que digo, engajo-me um pouco mais no mundo, e ao mesmo tempo, passo a emergir dele um pouco mais, já que o ultrapasso na direção do porvir. Assim, o prosador é um homem que escolheu determinado modo de ação secundária que se poderia chamar