o poder nú
Por Bertrand Russell
*Texto escrito em português clássico
À MEDIDA que a crença e os hábitos que mantiveram o poder tradicional decaem, vão cedendo gradualmente lugar ou ao poder baseado em alguma crença nova, ou ao poder "nu", isto é, à espécie de poder que não implica aquiescência alguma por parte do súdito. Êsse é o poder do carniceiro sôbre o rebanho, de um exército invasor sôbre uma nação vencida e da polícia sôbre os conspiradores desmascarados. O poder da Igreja Católica sôbre os católicos é tradicional, mas o seu poder sôbre os hereges que são perseguidos é um poder nu. O poder do Estado sôbre os cidadãos leais é tradicional, mas o seu poder sôbre os rebeldes é um poder nu. As organizações que mantêm o poder durante muito tempo passam, cm regra, por três fases: primeira, a da crença fanática, mas não tradicional, que conduz à conquista; depois, a do assentimento geral ao novo poder, que se torna ràpidamente tradicional e, finalmente, aquela em que o poder, sendo usado agora contra todos os que rejeitam a tradição, se torna de novo nu. O caráter de uma organização sofre grandes transformações ao passar por essas fases.
O poder conferido pela conquista militar deixa de ser, depois de um período maior ou menor de tempo, meramente militar. Tôdas as províncias conquistadas pelos romanos, exceto a Judéia, se tornaram logo leais ao Império, deixando de sentir qualquer desejo de independência. Na Ásia e na África, os países cristãos conquistados pelos maometanos submeteram-se, com pouca r elutância, a seus novos governantes. O País de Gales submeteu-se, aos poucos, ao domínio inglês, ao passo que a Irlanda não o fêz. Depois que os hereges albigenses foram sobrepujados pela fôrça militar, seus descendentes se submeteram tanto interior como exteriormente à autoridade da Igreja. A conquista normanda produziu, na Inglaterra, uma família real que, depois de algum tempo, foi considerada como possuidora de um Direito Divino
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