O pior dos mundos
Situação em Altamira põe a nu uma deficiência: ainda não conseguimos incluir os indígenas no debate nacional de forma efetiva
Por Spensy Pimentel, doutor em Antropologia pela USP e pesquisador do Centro de Estudos Ameríndios — publicado na edição 77, de junho de 2013
Muita coisa mudou na política brasileira desde a redemocratização do País nos anos 1980. Temos eleições diretas, liberdades, direitos garantidos por uma nova Constituição. Os partidos, as instituições e a sociedade civil avançaram muito. Mas ainda herdamos e reproduzimos velhas deficiências e vícios – especialmente quando se trata das relações com os povos indígenas do País. São 513 deputados federais e 81 senadores, mas nenhum deles representa os ocupantes de cerca de um oitavo do território brasileiro, um quinto de toda a Amazônia Legal, as terras indígenas, com quase 113 milhões de hectares. Um único indígena, o xavante Mário Juruna, conseguiu eleger-se deputado por um único mandato, entre 1983 e 1987. No último dia 16 de abril, um grupo formado por centenas de lideranças indígenas vindas de todo o País conseguiu um feito notável: ocuparam o plenário da Câmara Federal e abriram negociações para participar diretamente das discussões sobre uma série de mudanças legislativas que os afetam de forma contundente, apesar de eles, anteriormente, nunca terem tido oportunidade de debatê-las. O acontecimento chamou a atenção para um problema que tem tudo a ver com a situação vivida hoje pelos habitantes da região de Altamira (PA), onde se realizam as obras da Hidrelétrica de Belo Monte. O País precisa, urgentemente, aprender a dialogar com os povos indígenas, construir formas de incluí-los, de maneira efetiva, no debate democrático. A situação hoje é definida como “o pior dos mundos” por um antropólogo que trabalha na região. Enquanto as obras de Belo Monte avançam a toque de caixa, a sociedade civil tem sérias dificuldades para ser ouvida, e os órgãos públicos penam para