O motoqueiro e eu
Luiz Ernesto Cabral Pellanda
Psicanalista – SPPA
Descia a rua Garibaldi em direção à Rodoviária e pensei em entrar a direita na Farrapos. Olhei pelo retrovisor e vi um motoqueiro escrevendo entre os carros, vindo em minha direção e optando evidentemente por ultrapassar pelo lado direito, afinal era um dos que se prezam como tal. Ainda antes de ligar o pisca-pisca desisti da manobra para dar lugar a ele e segui descendo pela faixa central de rolamento. Quando ele passou por mim usou a mão esquerda para me fazer um sinal, oscilando a mão para um lado e outro, como a reclamar que eu estivesse ondulando pela pista.
Fiquei rindo e desejando poder dizer a ele “macaco, olha teu rabo!”, como nos tempos de piá no Partenon; ou como minha vó dizia: “A quem o dizes que não se lhe enchem os olhos de lágrimas...”. Era ela quem contava que quando Deus fez os homens, botou as virtudes em um saco à frente e os defeitos noutro atrás, dai ser mais fácil ver os defeitos dos outros do que os próprios.
Tudo isto vem à propósito deste nosso triste momento por que passa a humanidade, que prioriza o egoísmo e o acúmulo de bens sobre a solidariedade e o respeito pelo direito do outro ser um “outro” por si mesmo. Ler os comentários de twitter e facebook das notícias de um jogo de futebol que não terminou em São Paulo mostra torcedores daqui e de lá sem pejo de extravasar sua mesquinhez e falta de compostura, racismo, megalomania e que tais, tanto nos jornais do Brasil quanto nos da Argentina. Lamentável demonstração de uma velha tese de que somos ainda muito primitivos e mal entrados nesta civilização de pouco mais de cinco mil anos de sedentarismo agricultural. Ou seja, tempo nenhum em dimensão geológica. Há dois mil anos os leões comiam cristãos no Coliseu, há menos de quinhentos queimávamos hereges na fogueira, e há sessenta judeus e outros “diferentes” nos fornos crematórios nazistas. Hoje matamos de fome na África e na periferia de todas as grandes