O Homem que sabe
Do Homo Sapiens à crise da razão.
Viviane Mosé
Introdução:
Um ensaio sobre o pensamento.
O mundo contemporâneo é o resultado de um acúmulo de construções, de invenções que tiveram, em sua maioria, o objetivo de arrancar o homem das malhas da natureza. Em outras palavras, a humanidade que construímos, nestes últimos cem mil anos de Homo Sapiens, mesmo com suas inegáveis conquistas, mais do que estabilidade e auto - controle, apresentou requintes de crueldade superiores aos da animalidade, da qual queríamos tanto nos livrar. Permanecemos, de algum modo, atados ao momento em que nossa humanidade nasceu. Apesar de todas as conquistas, não nos afastamos da violência, da brutalidade; as peripécias tecnológicas não eliminaram, ao contrário, evidenciam nossa “dor sem corpo”, ¹ nossa angústia de animal que sabe, elabora, pensa. Não morremos mais tanto de tifo ou de febre amarela, mas de acidentes de trânsito, de latrocínios, de depressão, de sedentarismo, de obesidade... Permanecemos de algum modo presos ao princípio. Mas o processo de humanização nunca termina. A modernidade nos deixou como herança um enorme desenvolvimento tecnológico, mas nos deixou também uma absurda crise social, ambiental, econômica, por isso desmorona em consequência de sua própria exaustão. Ninguém está livre do caos social, do terrorismo. Não vivemos mais o mundo moderno, que se sustentou na ilusão de felicidade, de estabilidade, mas o mundo da desintegração, do desabamento da infinidade de construções que erguemos para sustentar a promessa de uma vida sem sofrimentos, sem perdas, sem morte. Movidos pela miséria e pelo pavor, construímos nossa civilização. Somos hoje herdeiros de projetos de mundo que prometiam vencer as desigualdades, eliminar o sofrimento e a angústia, controlar a natureza, mas estas expectativas desabaram, e continuam desabando. Reinventar a possibilidade de uma cultura que desaba, desde seus pilares mais íntimos, é a tarefa e ela é