o homem da areia
E.T.A HOFFMAN (Ernst Theodor Amadeus Wilhelm HOFFMAN)
Natanael a Lotar
Sem dúvida, estão todos preocupados por não lhes ter escrito durante tanto tempo. Mamãe deve estar zangada, e Clara pode estar pensando que aqui levo uma boa vida, esquecendo por completo sua querida imagem angelical, tão profundamente gravada em meu coração e em minha mente. Mas não e assim; todos os dias e a toda hora penso em vocês todos, e em doces devaneios aparece a minha querida Clarinha sorrindo-me com seus olhos tão graciosos, como de costume, quando estava junto a vocês. Ah, mas como poderia escrever-lhes com o estado de espírito tão dilacerado, que vem me confundindo todos os pensamentos! Algo de terrível aconteceu em minha vida! Sombrios pressentimentos de um cruel e ameaçador destino estendem-se sobre mim quais sombras de nuvens negras, impenetráveis a qualquer benevolente raio de sol. Agora devo dizer-lhe o que me aconteceu. Reconheço que é necessário fazê-lo, mas, só em pensar nisso, escapa-me um riso de louco. Ah, meu caríssimo Lotar, como farei para que de alguma forma você sinta que o que me sucedeu há alguns dias perturbou minha vida de maneira tão terrível? Se ao menos você estivesse aqui, poderia ver com seus próprios olhos; mas, tenho certeza, certamente vai me considerar um supersticioso visionário. Em suma, o terrível acontecimento em questão, de cuja fatal influência em vão esforço-me por evitar, consiste simplesmente em que, há alguns dias, exatamente no dia 30 de outubro, ao meio-dia, um vendedor de barômetros entrou em meu quarto e me ofereceu seus instrumentos. Não comprei nada e ameacei jogá-lo escada abaixo, mas ele então saiu voluntariamente.
Você pode imaginar que somente circunstâncias bem particulares e marcantes de minha existência são capazes de explicar o significado desse incidente, e que a pessoa desse funesto caixeiro-viajante possa ter um efeito pernicioso sobre mim. De fato, todo sangue-frio me é necessário para, com calma e