O historiador, o macaco e a centaura
O
M ACACO
E A
C E N TA U R A :
A
“H I S T Ó R I A C U L T U R A L ”
NO
NOVO MILÊNIO
O historiador, o macaco e a centaura: a “história cultural” no novo milênio
SERGE GRUZINSKI
Dialogando com um macaco e uma centaura
O
a história cultural hoje? Talvez possamos fazer a pergunta a dois amigos com os quais mantenho diálogo há vários anos e que me acompanharam em muitas conferências e viagens. Trata-se do macaco Ozomatli e da centaura Ocyrhoe. Eles vivem na cidade mexicana de Puebla, numa casa antiga chamada “Casa del Dean”, sobre um afresco pintado no fim do século XVI. O macaco Ozomatli é de origem pré-hispânica e pode ser identificado pelo seu brinco. O macaco era um dos signos do calendário ritual asteca e corresponde ao dia onze do calendário divinatório, estando associado à boa fortuna e à alegria, ou ainda à vida licenciosa. A centaura, por sua vez, chama-se Ocyrhoe, filha do centauro Chironte. Dela se diz que “revelava os segredos do destino”. Ou seja, tanto a centaura como o macaco são seres encarregados de anunciar o destino. Entre uma e outro podemos observar uma flor, que parece ser de poyomatli, um alucinógeno utilizado pelos índios antes e depois da Conquista, difundido entre espanhóis, mestiços e mulatos. Apesar das distâncias culturais gigantescas, podemos observar a conivência estabelecida entre a semideusa do paganismo grego e o deus ameríndio que compartilham dos meios – a flor – de conhecer o porvir. Não pode haver então melhores guias para tecer conjecturas sobre o que deverá ser a “história cultural” neste milênio.
QUE PODE SER
1. Etnocentrismos. A análise do afresco
nos obriga a sair duma visão europocêntrica e etnocêntrica da História
Hoje, os historiadores da Europa continuam manifestando pouca curiosidade pelo passado e pela historiografia que excedem as fronteiras da Europa ocidental, e às vezes mesmo as fronteiras da sua própria nação. Quanto aos especialistas da história mundial,