o futuro por metade
Um poeta fez um verso sobre uma mulher africana andando de bicicleta no campo e foi repreendido por um escritor sul-africano, pois, segundo ele, isso nunca poderia acontecer. Mia Couto defende o poeta, pois “mesmo que as mulheres de uma comunidade sejam proibidas de andar de bicicleta, a literatura é livre para inventar o que quiser”. Ele diz que a reação do autor sul-africano é uma revelação: o homem invocando interdições em nome da “essência” feminina vem da insegurança, do medo. Os homens não conhecem as mulheres, não sabem o que elas pensam e se sentem ameaçados com o que elas sentem. O futuro é uma bicicleta conduzida por uma mulher. Mas o presente dessa mulher é estar em um chapa-cem (táxi) guiado por mãos masculinas.
Ibsen, em sua peça A casa das bonecas, diz que uma mulher não pode ser ela própria nessa sociedade, pois se construiu como uma sociedade masculina, com leis traçadas para e por os homens e juízes masculinos que julgam a partir de critérios masculinos. E os moçambicanos olham Moçambique como uma entidade masculina. A sociedade vive em estado de violência contra a mulher.