O corpo vivo, o corpo morto
Toda teoria do corpo é inútil, diziam Horkheimer e Adorno em suas notas sobre a “Dialética do Iluminismo”: o corpo continua sendo o cadáver no qual ele foi historicamente transformado.
Isto implica uma dupla herança: o conceito e a visão do corpo têm sua origem na teologia do corpo do Senhor morto e desaparecido, e naquela medicina que obtém seus conhecimentos fundamentais por meio da dissecação de cadáveres do teatro anatômico. Ambas, numa mistura como em Rembrandt, dominaram de tal forma os conceitos de corpo na Europa, que até hoje não se conseguiu desenvolver uma teoria do corpo vivo que seja, ela mesma, viva.
É preciso falar também de teorias mortas que conseguem destruir tudo o que tocam. A morte de Deus já se tornou há muito um fato da história da ciência, ela própria atolada em conceitos vazios e idéias cegas.
E existe ainda um outro fenômeno que só recentemente começou a revelar seus imensos efeitos: a silenciosa transformação do corpo em uma imagem do corpo, a qual nega a diferença entre imagem e corpo. O imaginário assim surgido dá início, por um lado, à herança de poderes que foram dominantes na teoria e na prática medieval (teologia) e moderna (medicina). Por outro lado, tal imaginário substitui os corpos em sua realidade, tornando-os virtuais. No entanto, permanece por ora em aberto a quem compete dirimir a questão acerca da ausência e dos mortos.
A imagem do corpo atualmente em voga nega seu caráter de imagem. Num último lance totalitário, ela afirma ser tudo, razão pela qual o corpo, e na verdade cada corpo isoladamente, dela dependeria e por ela deveria guiar-se. É esse o terror atual da visibilidade que tematizamos há anos, e que hoje é assunto do presente congresso.
Ainda nos perguntamos como é possível que, decorridos alguns milênios após a pacificação do homem, ainda se registre um número aparentemente crescente de explosões de violência inesperadas em todo o globo terrestre. Kant, juntamente com